sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

Sobre quedas e tropeços



Quando éramos pequenos e estávamos aprendendo a andar, os adultos estendiam a mão para nos apoiar, para que não caíssemos e nos machucássemos. Eles iam pajeando a criança, até ela conseguir se firmar sozinha e caminhar com seus próprios pés. A vida era bem mais fácil e segura. Havia quem cuidasse para que não caísse, quem te ajudasse a se levantar, caso algum tropeço acontecesse. Mas o que ninguém contou é que, quando crescemos, esse apoio, suporte e generosidade desaparecem.
Cresci ouvindo da minha mãe para não esperar nada de ninguém e nunca entendia muito bem o que significava. Quando criança, sempre tive o suporte firme e generoso das mãos da minha mãe e do meu pai. Mãos zelosas, que sempre estiveram por perto, evitando muitos tropeços meus. E quando não conseguiram evitar, me ajudavam a me levantar.
Mas quando cresci, entendi perfeitamente o que minha mãe queria dizer. A realidade é bem mais dura e muitas vezes as mãos que um dia te apoiaram, não estão mais lá. Ou pior, essas mesmas mãos podem até te empurrar para baixo e impedir que você se levante. Podem ser mãos de familiares, de amigos, de estranhos. Sempre vai ter alguém querendo impedir que você se levante. É um parente invejoso, é um amigo da onça, é um colega de trabalho sem ética, é um estranho grosseiro. É muita gente no mundo querendo mais mal do que bem. É muita gente no mundo fazendo mais mal do que bem. É muita gente no mundo infeliz e querendo derrubar quem está lutando para ser feliz.
Depois que me mudei para Brasília – uma cidade tão perfeitamente organizada e tão cruelmente fria (não no sentido climático), aprendi que não só não devemos esperar nada de ninguém, como não devemos pedir nada a ninguém. Aqui conheci todo tipo de gente. Pessoas muito queridas, companheiras, solícitas, cuidadosas, mas também conheci outro tipo de gente.  Pessoas  que podem te ajudar, muitas vezes, e não te ajudam. Pessoas que antes eram suas amigas, não atendem mais ao telefone ou respondem mal quando te atendem. Pessoas que sentem um prazer sádico em ver a necessidade ou desespero do outro e não mover uma palha para aliviar a dor. Pessoas que perguntam “onde você mora?”, antes de perguntarem “como você está?” e acham natural isso. E se você não mora no Plano Piloto, ou não tem sobrenome/indicação política importante, mesmo que more nas Asas Norte ou Sul, você será ignorado com sucesso! Pessoas que se virem alguém caído, ajudam a pisar em cima. Pessoas que sempre esperam algo em troca.
Mas o foco deste texto não é Brasília e sim a verdade que não te contaram, quando você cambaleou, lá nos seus dois anos de idade e não te deixaram cair. Pois a verdade é que deveriam ter deixado você cair, se estrepar no chão. Deviam ter deixado você ralar os joelhos, quebrar um pé (ou um dente), ganhar uns roxos. Você certamente iria aprender a se levantar em situações de dificuldade muito mais facilmente. Sem depender de ninguém. No pain, no gain.
Por isso, não espere que te estendam a mão, não espere que te ofereçam ajuda, que te segurem para não cair. Não espere solidariedade, não espere bondade, não espere reconhecimento. Não espere nada de ninguém nem peça nada a ninguém. Aprenda a se levantar sozinho, mesmo com o joelho ralado, o pé torcido, o tendão machucado. Faça um esforço e levante-se. Se você não se levantar, passarão por cima. Se ninguém te oferecer ajuda, nem olhar para sua necessidade com solidariedade, levante-se. Sozinho ou sozinha, não importa. Levante-se! Você não tem outra escolha a não ser se levantar e seguir em frente.
Mas se em meio a tudo isso, alguém resolver te estender a mão e te oferecer ajuda para se levantar – sem interesse -, aceite. Agradeça a essa pessoa e a Deus. Provavelmente essa pessoa deve ter se machucado muito e seus joelhos ainda doem. E essa dor a faz lembrar que um pouco de solidariedade e empatia são necessárias para sarar seus próprios machucados. 
Lembre-se disso quando os seus estiverem sarando.

Daniele Van-Lume Simões    14 de dezembro de 2018