domingo, 18 de dezembro de 2016

O meu banheiro e Rodin


Poucos lugares me fazem sentir segura. Um deles, talvez o principal, é o meu banheiro. Lá, depois que passo a chave, me sinto livre de ter pressa, de ser chamada, de ser incomodada, porque se tem algo sagrado para as pessoas é quando ela vai ao seu próprio banheiro. 
No seu banheiro, ninguém ousa bater na porta e perguntar: está tudo bem? - Diferente do que acontece quando você vai ao banheiro na casa de alguém e demora mais que 5 minutos lá dentro. Te incomodam. Às vezes, você só quer um pouco de silêncio por perto. Ou retocar a maquiagem. Ou chorar. Ou, em último caso, fazer suas necessidades mesmo.
No seu banheiro não. Mesmo com uma visita te esperando na sala, ela fica lá, sentada, vendo tv, esperando a hora que você vai sair do seu banheiro, sem jamais pensar em te incomodar. Mesmo que você fique por lá meia hora seguida no mais absoluto silêncio.
O seu banheiro é sagrado, quase um templo, em que lá, você pode despir-se de qualquer tipo de artifícios - seja roupa, maquiagem ou sentimentos. Lá pode se demorar quanto quiser, pode ler um livro, responder e-mails (imagina seu chefe descobrindo que aquele e-mail importante foi escrito no intervalo entre suas necessidades e sua higienização?), pode se olhar no fundo dos seus próprios olhos, pode chorar, cantar, rir sozinho, pode ser você mesmo. Lá você está a salvo.
Quando passo a chave na porta, parece que abri um portal mágico e que ninguém vai me descobrir. Quando sinto os cheiros dos meus géis de banho, sinto prazer nas pequenas coisas, como sentir cheiros. E prazer nas grandes coisas: sentir-me limpa - verdadeiramente limpa, por dentro e por fora. Um bom banho com água morna e algo cheiroso faz milagres pra alma.
Quando estou no meu banheiro, me olho nos olhos através de um espelho, vejo aquela ruga que insiste em fincar, vejo meu corpo já não tão jovem, vejo um cabelo branco despontando no alto da cabeça, até posso ver uma lágrima escorrer, mas não me importo se estou apresentável. Ali, eu sou eu, sem artifícios. Ali eu posso me encarar de frente. Principalmente depois de um bom demaquilante.
Até acho que a famosa escultura "O Pensador" de Rodin foi simbolizando a sabedoria no banheiro. E talvez seja um sacrilégio expô-la aos olhos de milhares de curiosos num momento tão íntimo. Vai saber.
Mas não se iluda, não é qualquer banheiro, é no seu e somente seu banheiro que você encontra a paz, o alívio e o silêncio. O seu banheiro é essencial na sua sobrevivência e creia, meu amigo, que fazer as necessidades talvez fique num dos últimos lugares nessa luta que se chama vida.

Daniele Van-Lume Simões   18 de dezembro de 2016

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